por David Plassa*
Se abrisse mão
De tão pouco tudo
Que lhe convém
Se agarrasse
A ferocidade do inseguro
Estaria vestido como agora
O mesmo blazer
O mesmo tênis
As mesmas reivindicações
Sobre um mundo estranho com pessoas cruéis
Se os dedos não encruassem
Diante da fome e do desconforto
Diante da morte e do abandono
Se os dedos sentissem
A exata insignificância dos medos
Estaria vestido como agora
As mesmas manchas
Os mesmos dramas
Abotoados à camisa
Se soubesse
Que apaga cigarros
Ao invés de acendê-los
Vestiria-se com mais conforto
Um terno torto
Para esconder-lhe o farrapo de carne e sangue
E sangue
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*David Plassa saiu em um Fusca verde da maternidade em 1987 e se emociona com dinossauros. Já foi motorista, segurança, vendedor de chocolates, barista, auxiliar de biólogo, livreiro e, quando há estabilidade econômica, jornalista. Premiado ou selecionado para coletâneas de alguns concursos literários, mais ou menos tenta publicar um livro de poesias. David escreve toda quinta-feira.